TRAÇOS RITUAIS: TRÊS EPÍGRAFES E UM POEMA EM SEIVA VENENO OU FRUTO
Resumo
As aproximações entre literatura e rituais ameríndios costumam recorrer à antropofagia, arquivada em relatos de encontros com os Tupinambá, recuperada por Oswald de Andrade e retomada por concretos e tropicalistas. Neste procedimento de anacronismo deliberado, certa crítica tem visto a possibilidade de uma conjuração da cena fundacional do encontro colonial, configurando o entre-lugar do ritual constitutivo de uma literatura latino-americana [Silviano Santiago, 1971]. Nas últimas décadas, com o desenvolvimento da etnologia no país, passando pela ampliação dos estudos sobre o xamanismo e dando a ver uma contemporaneidade política que se consolida na constituição de 1988, assistimos à emergência de um outro imaginário ameríndio - ainda mais visível se atentarmos a outros países latinoamericanos, com a institucionalização da plurinacionalidade em Bolívia (2009) e Equador (2008). Nesta apresentação, proponho pensar esse percurso em Seiva veneno ou fruto, terceiro livro de poemas de Júlia de Carvalho Hansen, partindo de suas epígrafes: a primeira, um canto shipibo; a segunda, uma frase do conto "Meu tio, o iauaretê", de Guimarães Rosa; e a terceira, extraída do Eclesiastes bíblico. Os Shipibo (conglomerado de coletivos da família linguística Pano) situam-se no limiar Amazônia peruana/Andes, e são conhecidos por seu xamanismo de ayahuasca. A escrita do livro, segundo a poeta, está relacionada a experiências nestes rituais. Assim sendo, interessa pensar os pontos de enunciação e de vista dos poemas. Se neles não há "o índio" enquanto tema, todavia o livro permite pensar outras aproximações entre poesia e etnologia, em diálogo com teorias contemporâneas dos rituais ameríndios, entendidos como um ensaio de vínculos e relações.
Texto completo:
PDFApontamentos
- Não há apontamentos.