FRUTO TROPICAL: UMA ESPECULAÇÃO SOBRE A NOÇÃO DE “INESPECIFICIDADE” NA MODERNIDADE PERIFÉRICA LATINO-AMERICANA

Leonardo Bezerra Vilela

Resumo


Em Ressaca Tropical, o artista visual Jonathas de Andrade articula imagens retiradas de quatro arquivos fotográficos de Recife, principalmente do período de reconstrução e modernização que se seguiu às cheias de 1975, a fotografias recentes, tiradas por ele mesmo, de prédios de arquitetura modernista em estado de semi abandono. À montagem dessas fotografias, intercalam-se anotações de um diário anônimo encontrado no lixo da própria cidade. O projeto – que, antes de se tornar livro, foi concebido como uma instalação fotográfica – é apresentado da seguinte maneira: "Isoladamente, os componentes de Ressaca são documentos históricos. Porém, juntos, compõem uma grande ficção de cidade; um cenário que confunde o construir com o destruir, uma cidade que possui o mesmo retrato geral sempre, não importa o passar dos anos. Ali, a natureza implode a arquitetura, que se mistura ao lugar do desejo. Nesta ficção, Recife é uma cidade latino-americana qualquer, marcada pela pós-utopia de um projeto de modernismo externo à sua lógica". Interessante notar que, ao se referir ao fracasso do projeto de modernismo nos trópicos, Jonathas escolha falar de "uma cidade latino-americana qualquer", ao invés de uma cidade brasileira qualquer. Tendo em vista este cenário pós-utópico, que aqui será tomado como a disrupção provocada pelo discurso latino-americano na história do pensamento ocidental, e apostando numa formulação do ensaio O entre-lugar do discurso latino-americano, de Silviano Santiago: "A maior contribuição da América Latina para a cultura ocidental vem da destruição sistemática dos conceitos de unidade e de pureza"; pretende-se, nesta apresentação, pensar – e testar os limites – da noção de "fruto estranho", proposta por Florencia Garramuño, a partir de uma instalação homônima do artista visual e escritor brasileiro Nuno Ramos. Noção que, nos últimos anos, se tornou corrente dentro de certa crítica para designar objetos artísticos e literários de difícil localização; híbridos.

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