POÉTICA DA PRECARIEDADE E ELOGIO À ERRÂNCIA EM JOÃO ANTONIO: O EXEMPLO DE CALVÁRIO E PORRES DO PINGENTE AFONSO HENRIQUES DE LIMA BARRETO
Resumo
Em 1970, os relatos de um interno do Sanatório da Muda, no Rio de Janeiro, serviram de fonte para que o escritor e jornalista João Antonio escrevesse o livro Calvário e porres do pingente Afonso Henriques de Lima Barreto, publicado em 1977. O paciente, Carlos Alberto Nóbrega da Cunha, internado no hospital psiquiátrico com esclerose diagnosticada, havia sido diretor de importantes periódicos do início do século XX, e conheceu João Antonio no próprio sanatório, depois que o jornalista internou-se na mesma instituição, alegando estafa. De acordo com os depoimentos que deu a João Antonio, Carlos Alberto havia conhecido Lima Barreto no final de sua vida, quando o escritor vagava de bar em bar, como relatam os biógrafos Francisco de Assis Barbosa e Lilia Schwarcz. Narrado em primeira pessoa, o Calvário... detalha a rotina boêmia de Lima Barreto segundo as lembranças de Carlos Alberto: os botequins que freqüentava, as bebidas que tomava, as turmas que o cercavam, os assuntos de balcão. Este artigo analisa o livro à luz de dois conceitos. Primeiramente, discute a maneira pela qual João Antonio pôs em prática o que Maria Zilda Cury definiu como uma “poética da precariedade”, caracterizada por um corpo-a-corpo com a vida, ao criar uma possibilidade narrativa em um discurso marginalizado depois de internar-se por conta própria num sanatório, como revelam documentos da época. E também investiga como, ao atribuir àquelas memórias confinadas em espaços marginais – o bar, a rua, o sanatório – um novo sentido literário, compartilhando uma experiência comum de alteridade, João Antonio pratica o que Paola Berenstein Jacques definiu como “elogio à errância”.
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